MARIA RITA VALONGO PINTO Nº12 8ºB
Inspirada num quadro de Degas: O ensaio de dança da Ópera na Rua Le Peletier
Desde que tenho memória, o meu sonho é ser bailarina. A
minha avó, que tinha sido bailarina quando era jovem, contava-me sobre os
grandes bailados de Tchaikovsky. Eu ouvia atentamente e interrogava-me sobre
como era possível contar histórias tão bonitas apenas com a dança.
Fui crescendo sem nunca perder a paixão pela dança,
sempre a treinar e a competir. Mas a certa altura, os meus pais preocupados com
o meu sustento no futuro, disseram-me:
- Minha filha, inscrevemos-te numa audição para o papel
principal do bailado “O Lago dos Cisnes” numa companhia de bailado muito
conceituada. Tentarás obter o papel de Odette e, caso não o consigas, terás de
desistir do ballet e investir numa carreira mais segura e com que te
possas manter no futuro.
Naquele momento, surgiu em mim uma determinação que não
sabia que tinha. Nas semanas seguintes, comecei a treinar horas a fio e a
pensar somente em não deixar o meu sonho esvair-se por entre os meus dedos.
Finalmente,
chegou o dia da audição. Comecei a alongar-me enquanto esperava que o meu nome
fosse chamado pelos júris. A primeira das bailarinas a dançar chamou-me à
atenção, porque esqueceu-se da coreografia e foi alvo de risotas e de alguns
comentários maldosos. Quando fui chamada não hesitei e dancei exatamente como
tinha praticado, se não melhor. Rodopiei pela sala de forma graciosa e leve
como uma pena. Estava tudo perfeito! Até que fiz o meu salto final, que devia
deixar todos naquela sala boquiabertos. Mas quando aterrei senti algo a
atingir-me na perna e... pumba! Ouvi os risinhos das bailarinas e corei,
envergonhada por ter falhado o salto que havia treinado centenas de vezes nas
últimas semanas. Levantei-me e fui sentar-me no canto da sala, com lágrimas a
invadir-me os olhos. Depois deste desastre, só consegui prestar atenção a uma
das restantes audições de uma tal de Maria Alexandrova. Foi quase perfeita,
mas, quando terminou a apresentação, trocamos olhares e consegui perceber um
leve sorriso de escárnio.
Depois do que pareceu uma eternidade, algo captou a minha
atenção. Os dois júris levantaram-se e disseram que estavam prontos para
anunciar a decisão. O meu coração deu um pulo, ainda com um resquício de
esperança. Mas claro que quem foi escolhida, foi a Maria. Limpei as lágrimas
que me escorriam dos olhos, ainda sem aceitar que teria de desistir deste sonho
em que tinha investido tanto trabalho e dedicação. Mas, num impulso, a rapariga
que se tinha esquecido da coreografia no início das audições, deu um passo em
frente e pigarreou para chamar a atenção de todos na sala. Pareceu resultar
porque todos os olhos estavam postos nela. Então ela, numa voz bastante audível
e segura de si, disse:
-
Eu achei esta decisão injusta! Eu vi algo que pode comprometer a vitória da
Maria! – exclamou, firme e indiferente aos sussurros das bailarinas e dos
júris. – Quando a Anna fez o seu salto final, eu vi a Maria a lançar uma carica
para a pista para ela cair.
Demorei alguns segundos para processar que ela falava de
mim. Mas fazia tudo sentido! Eu tinha treinado aquele salto semanas a fim, sem
falhar uma só vez e é verdade que senti algo a bater-me na perna quando
aterrei. Mas nunca pensei que poderia ter sido sabotada.
As
acusações daquela rapariga sobre a Maria, foram rapidamente corroboradas por
outras bailarinas que também disseram ver a mesma coisa. A dada altura, um dos
júris disse:
- Ora bem, parece-me que temos apenas uma forma de provar
a verdade. Se a Anna conseguir realizar o salto agora mesmo ficaremos a saber
que foi sabotada e dar-lhe-emos o papel principal.
Era o meu momento! Fora-me dada uma segunda oportunidade
de provar o meu valor e não poderia desperdiçá-la. Respirei fundo e, avancei
segura de mim mesma e do meu potencial. E, provando a teoria da bailarina que
tinha acusado Maria, eu realizei o salto de forma perfeita! Quando aterrei,
ouvi sons de espanto e admiração, seguidos de um prolongado aplauso por parte
das bailarinas e dos júris. Sorri de alívio e comemorei por ter conseguido
manter o sonho da dança bem vivo e mais perto do que nunca.
Esta história ocorreu há bastantes anos, mas lembro-me
dela perfeitamente porque foi o início da minha carreira como dançarina
profissional. Depois desta audição participei em muitos bailados com companhias
renomadas e tornei-me mundialmente famosa. Nunca teria sido possível manter
vivo o legado da minha avó, se não fosse aquela
rapariguinha que não teve medo de ser honesta e de fazer o que estava certo.
Até hoje não sei o nome dela, mas estou-lhe muitíssimo grata!
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